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Raul Parfio | Alex Queity | ||
ANTES/DEPOIS ou INDIFERENÇA/AMOR Para quem ainda tem dúvidas, estas fotos, esclarecem muita coisa. Estas fotografias contam uma história de amor que eu testemunhei, no Gana, há 2 anos. O Raul foi batizado por mim quando o encontrei a trabalhar no lago Volta. Como escravo que era, não tinha nome porque foi vendido pelos seus próprios pais por menos de 5 euros, quando tinha apenas 3 anos. O pescador a quem pertencia tinha-lhe dito que se afastasse dos “brancos” porque, se eles o encontrassem, iriam “esfolá-lo vivo”. Esta foi a forma que o pescador encontrou para o manter longe da equipa de resgate da Touch a Life Kids e que justifica o facto de Raul se mostrar aterrorizado quando abordámos o barco onde trabalhava. Fui eu que tirei esta fotografia e lembro-me, como se fosse hoje, que o que mais me impressionou não foi a forma como tremia em pânico mas a falta de brilho no seu olhar. Porquê? Porque sabia que era possível acalmá-lo, tratar da sua saúde, vestir-lhe roupa nova e mandá-lo para a escola mas tinha medo de não conseguirmos recuperar a infância que lhe tinham roubado. O mais difícil era ultrapassar um trauma de maus tratos e exploração durante anos. O mais difícil era convencê-lo de que tinha direito a estudar, brincar e a ser feliz como qualquer criança. O mais difícil era recuperar aquele brilhozinho no olhar que só têm as crianças felizes. Hoje, olhando para a segunda fotografia, não tenho dúvidas que conseguimos e, isto, só foi possível com doações como a vossa que permite à mama Pam garantir aos 65 filhos que já resgatou, comida, saúde, escolaridade e uma infância feliz. Não sei exatamente para que projeto vai ser utilizado o dinheiro que vocês angariaram. Pode ser para comprar bicicletas, fardas para a escola, cadernos, livros, alimentos ou até ajudar na construção de uma nova escola… A verdade é que, no final das contas, o vosso dinheiro servirá para fazer toda a diferença e garantir brilhozinhos no olhar destas crianças! É em nome delas que vos quero agradecer. MUITO OBRIGADA por não terem ficado indiferentes porque, acreditem, o que vocês todos fizeram foi escrever uma nova história de amor! Alexandra Borges Jornalista |
Em 2007, três meses depois de regressar do Gana e de ter resgatado com o George as nossas primeiras 3 crianças (Queitey, Osmand e Isaac), recebi uma carta com esta fotografia do pequeno Queitey que, mal desconfiava, iria mudar toda a minha vida. A minha primeira reação foi de um convencimento que, hoje, sinto como constrangedor e do qual muito me envergonho. Confesso aqui e agora, despida de tudo, perante todos, que o meu ego me ajudou a acreditar que o Queitey me tinha dedicado o quadro. Achei enternecedor que ele, na altura com 6 anos, dedicasse as horas da sua aula de pintura, para delinear cuidadosamente o barco que o escravizara e pintara com, as cores da bandeira portuguesa, o orfanato que o estava a libertar, através da educação escolar. Tudo no quadro indicava que ele o tinha dedicado a mim…até o meu nome ele tinha colocado junto ao dele formando a conjugação de palavras “Alex Queitey”. Chamo-me Alexandra mas, normalmente os amigos, tratam-me por Alex e, no Gana, pela dificuldade da língua, achei prudente começar por dizer a todos que o meu nome era Alex. Não perdi tempo a olhar o quadro com o coração, só estava a conseguir vê-lo com os olhos e resolvi ligar para o Gana para pedir que agradecessem ao Queitey (que na altura ainda não falava inglês, apenas o dialeto da sua aldeia) tamanho presente. Confesso que estava lisonjeada e orgulhosa deste meu filho do coração e tinha urgência em dizer-lho. No orfanato Villadge of Hope, uma espécie de aldeia da esperança onde uns “pais adotivos” e casal de educadores são responsáveis por uma casa onde vivem 10 crianças, atendeu-me um professor a quem me apressei a pedir que desse um grande abraço e um beijo ao pequeno Queitey por ele me ter dedicado o quadro que pinto. Surpreso, o professor garantiu-me que o iria fazer mas aproveitou para me corrigir. - O Queitey não lhe dedicou o quadro. Ele assinou o quadro? -Assinou?!- exclamei surpreendida. - Sim, assinou. Como sabe, quando vocês se foram embora, voltamos a levar cada criança ao médico que para fazer a ficha clínica necessita de um nome e um apelido e, como Queitey é um apelido, disse à criança que tinha que escolher um nome próprio e, o Queitey, respondeu prontamente que se queria chamar “Alex, como a mulher branca!”!!!!! Gelei. Fiquei em silêncio longos minutos sem reparar que o professor tentava, em vão, restabelecer a comunicação através de recorrentes “hello, hello, hello…”. O meu mundo tinha vindo abaixo com tamanho gesto de generosidade do meu pequeno herói. O Alex Queitey tinha-me feito a maior homenagem que alguém alguma vez me fez. Discretamente, ele e a sua timidez tinham-me deixado tão constrangida que não conseguia verbalizar nem uma palavra. - Diga-lhe que eu o amo! – foi a única frase que consegui construir para conseguir desligar e mergulhar num sofrimento profundo e num choro resistente. |